A mobilização começou às 13 horas, com uma concentração no Largo da Misericórdia. Aqui, ouviram-se canções de intervenção e leram-se comunicados ao altifalante. Um grupo de companheiros distribuiu ainda uma sopa entre os presentes. Apesar da forte chuva que começou a cair, cerca de 150 pessoas não arredaram pé e iniciaram uma marcha pelas ruas estreitas da zona mais antiga da cidade fazendo ecoar palavras de ordem como “Nem Estado, nem patrão, autogestão!”, “Não negociamos a nossa escravidão! A vida é nossa, não é do patrão!” ou “Sabotagem, greve selvagem!”. A manifestação seguiu para a Praça do Quebedo, onde se estava a iniciar a manifestação da CGTP. Ao longo da Avenida 5 de Outubro o protesto continuou na cauda do desfile da CGTP, constituindo o sector mais animado e combativo desta marcha e recebendo a aprovação de muitas das pessoas que assistiam. Depois, a manifestação separou-se da CGTP e continuou o seu percurso em direcção a um dos bairros populares de Setúbal. Apesar da divergência em relação às frases gritadas pelos dirigentes da CGTP, que foram apelando à “luta” através do voto durante o percurso, não se verificaram quaisquer incidentes, nem nesta nem nas outras partes do percurso.
A manifestação terminou no Largo da Fonte Nova, onde os manifestantes pousaram as suas faixas no chão e se preparavam para descansar e conviver. A partir do sistema de som dum carro estacionado no largo, voltaram-se a ouvir músicas revolucionárias. No entanto, poucos minutos depois da chegada à praça, um grupo de polícias, numa atitude provocatória, insistiu em identificar e deter as pessoas que se encontravam junto ao carro do som. Com isto, iniciou-se o confronto entre a polícia e os manifestantes que tentaram impedir a detenção destes companheiros e defender-se dos ataques. A polícia utilizou gás pimenta contra a cara de alguns manifestantes e começou a disparar balas de borracha contra quem estava no largo. Um agente chegou a disparar tiros reais para o ar.
Atónitos, perante a actuação desmedida da polícia contra uma manifestação do Primeiro de Maio, os habitantes do bairro mostraram-se solidários e ajudaram alguns dos feridos. Os manifestantes conseguiram retirar-se do local em conjunto, mas acabaram por ser perseguidos pelas ruas de Setúbal, sendo continuamente alvo de bastonadas e de disparos de balas de borracha. Algumas pessoas foram detidas para identificação, tendo sido espancadas sob custódia policial, e muitas mais ficaram feridas.
A polícia conseguiu o seu objectivo, perfeitamente em consonância com os princípios do Estado policial e do capitalismo de austeridade: punir quem quer que se queira manifestar para além do protesto controlado e inofensivo das centrais sindicais oficiais e dos movimentos inofensivos de “cidadãos indignados”. Numa altura em que a burguesia portuguesa, com o apoio do FMI e da União Europeia, anuncia, através dos meios de propaganda de massas por si controlados, que a única solução para a “crise” que eles criaram e com a qual continuam a lucrar, será cumprir o seu projecto de sempre – reduções salariais, despedimentos livres, privatização dos serviços essenciais, etc. –, a actuação da PSP em Setúbal é um forte sinal de que a cambada que nos governa e explora, e os seus obedientes mercenários, não está disposta a tolerar manifestações que enunciem qualquer forma de luta efectiva e não-controlada. Em véspera de eleições, querem-nos fazer crer que só podemos mudar algo através do voto, quando há muito sabemos que ao votar só estamos a legitimar um sistema que nos explora e oprime.
O Primeiro de Maio é uma data que evoca a luta secular dos explorados e oprimidos de todo o mundo. Por isso lembramos os chamados “Mártires de Chicago” e recordamos também os dois operários assassinados há cem anos, em 13 de Março de 1911, nessa mesma terra de Setúbal, com as balas da Guarda Republicana – António Verruga e Mariana Torres. Em Chicago, em 1886, os trabalhadores lutavam pela jornada de oito horas de trabalho, enfrentando as balas da polícia, e para que as conquistassem muito sangue teve de ser derramado. Em Setúbal, em 1911, os trabalhadores protagonizaram a primeira greve geral depois da queda da monarquia, em solidariedade com a luta das operárias conserveiras, confrontando as forças armadas da República.
Hoje, como ontem, temos as armas contra nós e vemo-nos perseguidos pelos cães de guarda do Estado e do Capital. Mas também hoje, como ontem, levamos um mundo novo nos nossos corações, e os golpes que nos desferem só nos fazem acreditar mais na justeza dos ideais e das formas de luta que defendemos.
Contra a repressão, solidariedade! Contra a exploração, acção directa!
Unidos e auto-organizados, nós damos-lhes a crise!
Unidos e auto-organizados, nós damos-lhes a crise!
Associação Internacional dos Trabalhadores – Secção Portuguesa
Núcleo de Lisboa
ait-sp.blogspot.com
No comments:
Post a Comment