5.05.2011

Repressão policial contra o Primeiro de Maio Anti-autoritário e Anticapitalista em Setúbal

O “Primeiro de Maio anti-autoritário e anticapitalista”, em Setúbal, foi convocado com um apelo à recuperação da tradição combativa e anti-autoritária do “dia do trabalhador”. Desta forma, procurou ser “uma mobilização não controlada por nenhuma força partidária, por nenhuma central sindical ou qualquer força de repressão e controlo do Estado”. Em larga medida, este objectivo foi conseguido. Numa altura em que os poderosos disputam ferozmente as migalhas que querem roubar aos que já pouco têm, uma manifestação que apontou outro caminho de luta e resistência teve de ser reprimida pela polícia.


A mobilização começou às 13 horas, com uma concentração no Largo da Misericórdia. Aqui, ouviram-se canções de intervenção e leram-se comunicados ao altifalante. Um grupo de companheiros distribuiu ainda uma sopa entre os presentes. Apesar da forte chuva que começou a cair, cerca de 150 pessoas não arredaram pé e iniciaram uma marcha pelas ruas estreitas da zona mais antiga da cidade fazendo ecoar palavras de ordem como “Nem Estado, nem patrão, autogestão!”, “Não negociamos a nossa escravidão! A vida é nossa, não é do patrão!” ou “Sabotagem, greve selvagem!”. A manifestação seguiu para a Praça do Quebedo, onde se estava a iniciar a manifestação da CGTP. Ao longo da Avenida 5 de Outubro o protesto continuou na cauda do desfile da CGTP, constituindo o sector mais animado e combativo desta marcha e recebendo a aprovação de muitas das pessoas que assistiam. Depois, a manifestação separou-se da CGTP e continuou o seu percurso em direcção a um dos bairros populares de Setúbal. Apesar da divergência em relação às frases gritadas pelos dirigentes da CGTP, que foram apelando à “luta” através do voto durante o percurso, não se verificaram quaisquer incidentes, nem nesta nem nas outras partes do percurso.

A manifestação terminou no Largo da Fonte Nova, onde os manifestantes pousaram as suas faixas no chão e se preparavam para descansar e conviver. A partir do sistema de som dum carro estacionado no largo, voltaram-se a ouvir músicas revolucionárias. No entanto, poucos minutos depois da chegada à praça, um grupo de polícias, numa atitude provocatória, insistiu em identificar e deter as pessoas que se encontravam junto ao carro do som. Com isto, iniciou-se o confronto entre a polícia e os manifestantes que tentaram impedir a detenção destes companheiros e defender-se dos ataques. A polícia utilizou gás pimenta contra a cara de alguns manifestantes e começou a disparar balas de borracha contra quem estava no largo. Um agente chegou a disparar tiros reais para o ar.

Atónitos, perante a actuação desmedida da polícia contra uma manifestação do Primeiro de Maio, os habitantes do bairro mostraram-se solidários e ajudaram alguns dos feridos. Os manifestantes conseguiram retirar-se do local em conjunto, mas acabaram por ser perseguidos pelas ruas de Setúbal, sendo continuamente alvo de bastonadas e de disparos de balas de borracha. Algumas pessoas foram detidas para identificação, tendo sido espancadas sob custódia policial, e muitas mais ficaram feridas.

A polícia conseguiu o seu objectivo, perfeitamente em consonância com os princípios do Estado policial e do capitalismo de austeridade: punir quem quer que se queira manifestar para além do protesto controlado e inofensivo das centrais sindicais oficiais e dos movimentos inofensivos de “cidadãos indignados”. Numa altura em que a burguesia portuguesa, com o apoio do FMI e da União Europeia, anuncia, através dos meios de propaganda de massas por si controlados, que a única solução para a “crise” que eles criaram e com a qual continuam a lucrar, será cumprir o seu projecto de sempre – reduções salariais, despedimentos livres, privatização dos serviços essenciais, etc. –, a actuação da PSP em Setúbal é um forte sinal de que a cambada que nos governa e explora, e os seus obedientes mercenários, não está disposta a tolerar manifestações que enunciem qualquer forma de luta efectiva e não-controlada. Em véspera de eleições, querem-nos fazer crer que só podemos mudar algo através do voto, quando há muito sabemos que ao votar só estamos a legitimar um sistema que nos explora e oprime.

O Primeiro de Maio é uma data que evoca a luta secular dos explorados e oprimidos de todo o mundo. Por isso lembramos os chamados “Mártires de Chicago” e recordamos também os dois operários assassinados há cem anos, em 13 de Março de 1911, nessa mesma terra de Setúbal, com as balas da Guarda Republicana – António Verruga e Mariana Torres. Em Chicago, em 1886, os trabalhadores lutavam pela jornada de oito horas de trabalho, enfrentando as balas da polícia, e para que as conquistassem muito sangue teve de ser derramado. Em Setúbal, em 1911, os trabalhadores protagonizaram a primeira greve geral depois da queda da monarquia, em solidariedade com a luta das operárias conserveiras, confrontando as forças armadas da República.

Hoje, como ontem, temos as armas contra nós e vemo-nos perseguidos pelos cães de guarda do Estado e do Capital. Mas também hoje, como ontem, levamos um mundo novo nos nossos corações, e os golpes que nos desferem só nos fazem acreditar mais na justeza dos ideais e das formas de luta que defendemos.


Contra a repressão, solidariedade! Contra a exploração, acção directa!

Unidos e auto-organizados, nós damos-lhes a crise!

Associação Internacional dos Trabalhadores – Secção Portuguesa
Núcleo de Lisboa


ait-sp.blogspot.com


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